27/02/14

O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO

As várias teorias sobre a natureza do processo de senescência podem agrupar-se em dois tipos: as teorias do envelhecimento programado e as teorias do desgaste. A conceção do envelhecimento como fenómeno programado assenta na existência de um presumido relógio biológico a comandar a evolução de cada indivíduo. Segundo alguns, esta interpretação também colhe argumentos na perspetiva da evolução. Depois de ter passado os seus genes, termina o interesse do animal para a espécie: já fez o seu papel e por isso deixa de ser necessário. Portanto, não pareceria destituído de sentido admitir um mecanismo biológico que, após o período fértil, promovesse o declínio progressivo até surgir a morte, de que é exemplo extremo o salmão que sofre uma tempestade hormonal com produção de enormes quantidades de corticosteroides, sobretudo na altura da reprodução, seguida de morte rápida.
 
De facto, hoje poucos duvidam que o nosso capital genético esteja implicado no envelhecimento e, aparentemente, por vias idênticas às que se verificam em várias espécies animais. Uma das vias dessa ação genética traduz-se na propensão para sofrer de doenças relacionadas com a idade. Mais ainda, em vários animais de experiência foi possível aumentar a longevidade intervindo nos genes.
 
O envelhecimento programado seria pois um processo inscrito nos genes, semelhante ao programa que promove a elaboração dos vários órgãos e tecidos do feto e, depois, ao desenvolvimento da criança através das várias fases da vida extrauterina, até ao aparecimento da maturidade sexual. Mas o envelhecimento programado não explica tudo. Por exemplo: como perceber que o mecanismo que faz surgir todas as fases do desenvolvimento até à puberdade dentro de períodos precisos, com escassas variações temporais, explique as grandes diferenças do processo de envelhecimento de pessoa para pessoa?
 
Visão diferente é de o envelhecimento não resultar de qualquer determinismo genético, mas de um processo de desgaste que se situa na relação do meio ambiente com as células, processo de tipo estocástico, originado portanto em danos acidentais. A senescência resultaria, assim, de agressões celulares incidindo a nível molecular. O envelhecimento não seria então um processo fisiológico, antes o resultado de uma desregulação condicionada por fatores externos, uma doença, afinal.
 
Não é recente a conceção de que a velhice é uma doença. Públio Terêncio Africano, um dramaturgo latino que viveu no II século antes de Cristo, na sua comédia Phormio, pôs um homem a perguntar a um velho de que doença padecia, ao que este respondeu “Porque perguntas? A doença é a própria velhice” e Séneca foi mais longe ao dizer: a velhice é ela mesma uma doença incurável (senectus enim insanabilis morbus est).
 
Hoje é geralmente admitido que o envelhecimento é condicionado quer pelo capital genético, quer pelos fatores ambientais. Contudo, o papel dos genes, ainda que importante, não é o mais fundamental, pois se admite que eles só contam com 25% para o que será a velhice da pessoa, se bem que a importância relativa das várias causas varie de indivíduo para indivíduo. Mas além dos aludidos fatores genéticos e ambientais, devemos reconhecer que há outros capazes de condicionar o processo, podendo acelerá-lo ou retardá-lo. Neste contexto, têm sido avançadas várias teorias para o envelhecer que poderíamos designar teorias psicossociais. É sabido, por exemplo, que as pessoas envelhecem menos se se mantiverem ativas, ocupadas e igualmente as favorece se continuarem a ter na idade avançada os mesmos hábitos e estilo de vida que tinham nas décadas antecedentes (teorias da atividade e da continuidade). Exemplo oposto é a teoria da desvinculação (disengagement theory) de Henry e Cumming. Esta presume que é o afastamento das pessoas idosas no que se refere ao desempenho de funções ativas na sociedade (roleless role) a causa do envelhecimento, afastamento que seria da iniciativa do idoso. A teoria da desvinculação é objeto de críticas sérias. Admite-se mesmo que a maioria das pessoas que mostram desvinculação já antes apresentava um perfil psicológico de menor envolvimento social. Por outro lado, a desvinculação pode ser involuntária e até indesejada pela pessoa, sendo neste caso da iniciativa da sociedade, como sucede quando o velho é “depositado” num lar de idosos.
 
Prof. Doutor Henrique Vilaça Ramos

25/02/14

O QUE É A VELHICE?

Mas de que falamos quando falamos de velhice? Muito na linha de Peter Medawar, de Alex Comfort e de Bernard Strehler, pode dizer-se que a senescência corresponde ao aumento progressivo da vulnerabilidade a todo o tipo de agressões que incidem sobre nós, de que resulta também, com o passar dos anos, o incremento da probabilidade de morte. Embora, segundo estes autores, a morte nunca seja “natural”, na prática pode considerar-se que ela resulta da senescência progressiva da pessoa e é o desembocar natural do seu percurso biológico. Um octogenário, cuja filha andava preocupada com a possibilidade de ele morrer de repente, comentou com perspicácia: “Depois dos 80 já ninguém morre de repente…”. Séneca, contemporâneo de Cristo, já tinha dito: a morte não se abate sobre nós repentinamente, avança lentamente (non repente nos in mortem incidere sed minutatim procedere). E acrescentou morremos diariamente (quotidie morimur).

Poderá perguntar-se: mas há alguma fronteira a partir da qual se entra na velhice? Obviamente que para ser velho não é preciso chegar à fase a que John Kenneth Galbraith chamou “síndrome do ainda” (still syndrome). Essa é a situação que se verifica quando a pessoa começa a ouvir dizer: “Então, ainda a dar o seu passeio?” ou “Ainda interessado na política?”... É um ainda que não consegue esconder a exclamação, não formulada, mas subentendida: “Afinal, ainda não morreu!”.

Para os demógrafos, a anciania é estabelecida geralmente nos 65 anos. Mas esta é uma convenção que pode vir a ser alterada, tendo em conta a nossa sobrevivência cada vez maior e o facto de nos mantermos de boa saúde até mais tarde. Já o Estado determina uma espécie de velhice oficial: a da idade da reforma.

No plano biológico, pode considerar-se que o processo de envelhecimento começa no zigoto, mas é obviamente um absurdo chamar velho a uma criança, ainda que na nossa língua digamos que uma criança de 2 anos é mais velha que uma de um ano, reconhecendo afinal que a velhice já está presente na infância. Mas não sendo no zigoto, onde situar a marca biológica a partir da qual se entra na velhice? Poderia dizer-se que, na mulher, a fronteira da velhice é a menopausa. E no homem? Nele não é aceitável a existência de uma andropausa, se a pensarmos como um processo rápido, semelhante ao que ocorre no organismo feminino, correspondente à perda da capacidade reprodutora. Por isso, não há no homem uma fronteira tão nítida em termos biológicos que permita situar nela o início do envelhecimento. É possível invocar outros indicadores biológicos do envelhecimento, como é o caso do declínio do sistema imunitário, em grande parte dependente da involução do timo que é total aos 60 anos, mas que também é progressiva a partir da juventude.

A verdade é que não se pode traçar uma fronteira precisa para o início da velhice, nem biológica, nem sociológica. A própria perceção da velhice tem variado ao longo do tempo. Se no império romano a expectativa de vida rondava os 30 anos, seria aceitável considerar anciãos os que atingiam os 40. Com a muito maior longevidade atual, também a fronteira da velhice se deslocou muito para diante, o que é um dos aspetos novos do envelhecimento na espécie humana. Hoje é comum ouvir-se dizer de alguém que faleceu: “era novo, só tinha 60 anos”. Este caráter subjetivo da perceção do início da velhice, verifica-se também em relação à idade da pessoa que fala. Desde sempre que, para os jovens, o conceito de velhice é diferente da opinião de uma pessoa mais avançada em anos. Foi nessa linha que Bernard Baruch pôde dizer: "Nunca serei velho. Para mim, a velhice começa 15 anos depois da idade em que estiver".

Prof. Doutor Henrique Vilaça Ramos

24/02/14

VIAGEM AO OUTONO DA VIDA



Os próximos posts serão dedicados à temática do envelhecimento. Solicitamos ao Prof. Doutor Henrique Vilaça Ramos autorização para reproduzir neste espaço o texto luminoso que escreveu sobre o assunto, que foi amavelmente concedida. O texto integral com as respetivas referências bibliográficas, baseado na sua comunicação à Academia Nacional de Medicina de Portugal (Coimbra, 13.04.2013), foi publicado na Revista Brotéria 176 (5/6) Maio/Junho 2013.

«O envelhecimento, que marca o outono da vida e a leva até ao seu fim último, é o destino inexorável de todo o ser humano que não foi ceifado antecipadamente pela gadanha impiedosa de uma morte prematura. Visitar o outono da vida é de inegável atualidade, não só por serem os velhos uma população cada vez mais numerosa em Portugal, mas também porque, sendo o envelhecimento uma questão velha, a velhice atual coloca problemas novos.

Temos cada vez mais pessoas idosas e idosos mais longevos, graças ao aumento da esperança média de vida que se deve à melhoria de condições como o saneamento básico, alimentação e abrigo, mas também, ainda que em menor grau, aos progressos nos cuidados médicos: prevenção, diagnósticos mais precoces, tratamentos e reabilitações mais eficazes.

No império romano, a esperança de vida era baixa, rondava os trinta anos, e no dealbar do século XX tinha subido para 45 anos. Em Portugal, a esperança de vida ao nascer é de 79,6 anos (homens, 76,5 e mulheres, 82,4). Isto é: em pouco mais de um século, ganharam-se cerca de 35 anos, quase dobrou a esperança de vida! Esta evolução levou alguém a dizer, com um humor desconsolado: “é verdade que acrescentámos mais anos à vida, mas o mal é que são os últimos”. Todavia, esta boutade não corresponde inteiramente ao que se passa, pois que, apesar de na fase última do processo de envelhecimento ser cada vez maior a incidência das doenças geriátricas, mercê desse importante aumento da longevidade, também é certo que o tempo de vida com boa saúde ou, pelo menos, com saúde regular é cada vez mais longo».
 
Prof. Doutor Henrique Vilaça Ramos
Professor Catedrático Jubilado da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, Portugal

20/02/14

AS EXPERIÊNCIAS NAZIS EM SERES HUMANOS

 
A história da experimentação humana é prova dos êxitos extraordinários da ciência médica em benefício da humanidade. Contudo, é também testemunha do abuso de seres humanos pelo seu próximo, na procura do conhecimento.
 
Sabe-se atualmente que foram realizadas pelo menos 26 tipos de experiências em seres humanos, nos campos de concentração nazis. Muitas delas pretendiam justificar as teorias eugénicas e promover o apuramento e supremacia raciais. Outras destinavam-se a desenvolver mecanismos de defesa corporal do exército, aviação e marinha alemães em circunstâncias desfavoráveis como naufrágios ou queda de aeronaves. Algumas, numa clara e perversa inversão de valores, destinavam-se à descoberta do método mais rápido e eficaz de aniquilar a vida humana, não se distinguindo de outras formas de tortura cruel.
 
As experiências realizadas por Josef Mengele, médico-chefe do campo de concentração de Auschwitz-Birkenau, entre 1943 e 1945, em gémeos, anões e indivíduos com diversas anomalias genéticas, representam um exemplo extremo da utilização abusiva e prepotente de cobaias humanas com fins pseudocientíficos. Mengele dedicava-se ao estudo das características genéticas das raças, tendo em vista o aperfeiçoamento da “raça” ariana. Com essa finalidade, escolheu entre os prisioneiros de guerra cerca de 1500 irmãos gémeos, que usava como cobaias. Muitas vezes mandava matá-los, após certas experiências, para estudar os cadáveres na autópsia. Os deficientes eram outro dos seus interesses, de modo a provar que os judeus eram uma “raça” inferior. Mengele foi também responsável por selcionar para a morte centenas de milhar de homens, mulheres e crianças, junto aos portões de Auschwitz.
 
É hoje um dado adquirido que a maior parte destas experiências perversas e cruéis, utilizando como cobaias homens, mulheres e crianças, não produziram qualquer progresso científico válido. Mas ainda que tivessem interesse científico, coloca-se a questão da licitude da utilização dos resultados dessas experiências. Eva Mozes Kor, uma sobrevivente das experiências de Auschwitz, apresenta uma ideia original: “Os dados das vítimas deveriam ser rasgados em tiras e colocados num monumento transparente, como evidência de que existem, mas não podendo ser utilizados. Deveriam servir como uma lição ao mundo de que a dignidade e a vida humanas são mais importantes do que qualquer avanço na ciência ou na medicina”. 

17/02/14

MAIS VALE PREVENIR…

O Dr. David Agus, oncologista e autor do livro O Fim da Doença (Pergaminho, 2013) recomenda 10 formas de reduzir o risco de desenvolver uma doença grave como o cancro ou a demência:
 
1. Consuma alimentos naturais.
2. Evite tomar vitaminas e suplementos.
3. Fale com o seu médico sobre a necessidade de tomar aspirina e estatinas.
4. Participe em programas de rastreio de cancro.
5. Faça exercício regularmente e movimente-se ao longo do dia.
6. Mantenha um índice de massa corporal baixo.
7. Evite o tabaco.
8. Evite a exposição solar direta sem um protetor solar.
9. Evite fontes de inflamação.
10. Tome anualmente a vacina da gripe.
 
Já dizia o médico português Pedro Hispano (1215-1277) no seu Livro Sobre a Conservação da Saúde, “que é mais útil prevenir as doenças do que, uma vez contraídas, andar a pedir um auxílio, que provavelmente é impossível”.

10/02/14

HIGIENE DAS MÃOS


Lavar as mãos corretamente com água e sabão é a forma mais simples e eficaz de ajudar a reduzir a transmissão de infeções e proteger-se a si e aos que o rodeiam.
 
Siga os passos corretos de lavagem das mãos, de acordo com as imagens apresentadas. A lavagem das mãos deverá demorar pelo menos 1 minuto para ser eficaz.
 
De modo a prevenir infeções, poderá lavar as mãos algumas vezes durante o dia, mas principalmente nas situações seguintes:

Antes de comer ou manusear os alimentos
Após ter utilizado a casa-de-banho
Após assoar o nariz, tossir ou espirrar
Após tocar em animais ou nos seus dejetos
Após manusear resíduos
Após mudar fraldas
Antes e após tocar em doentes ou feridas
Antes e após ir de visita a uma enfermaria

Fonte: Associação Nacional de Controlo de Infeção

05/02/14

A ATIVIDADE FÍSICA DEVE SER UM HÁBITO DIÁRIO


O Professor Manuel Carrageta, distinto cardiologista português e autor do livro Como Ter um Coração Saudável, refere que “se os benefícios do exercício pudessem ser vendidos sob a forma de comprimidos, a atividade física seria hoje certamente o medicamento mais prescrito pelos médicos” (p. 29). Como isso não é possível, devemos seguir as suas importantes sugestões de tornar a atividade física um hábito diário (p. 97):
 
Em vez de conduzir o automóvel, faça a pé os percursos mais pequenos.
Suba e desça as escadas em vez de tomar o elevador, sobretudo quando se trata de um a dois andares.
Desça do autocarro ou do metro uma estação antes do destino e complete o percurso a pé.
Quando for às compras, estacione o carro num lugar distante do parque.
Quando for possível, vá almoçar ou jantar a pé.
Faça um intervalo para exercício, em vez de intervalo para café.
Faça passeios a pé com a família ou os amigos.

03/02/14

CONSUMO DE FRUTOS SECOS ASSOCIADO A MAIOR LONGEVIDADE



De acordo com um estudo publicado no New England Journal of Medicine em Novembro passado, o consumo regular de uma mão-cheia de frutos secos, sem sal e não fritos, está associado a uma menor taxa de mortalidade devida a doenças cardíacas, respiratórias ou oncológicas.
 
Nesta investigação, quem consumia frutos secos (p. ex. nozes, amendoins, amêndoas, caju) sete ou mais vezes por semana tinha uma taxa de mortalidade 20 % mais baixa do que as pessoas que não ingeriam estes alimentos.
 
O consumo de frutos secos é mais uma medida que poderá contribuir para uma maior longevidade, sobretudo quando associada a outros hábitos saudáveis como o exercício físico e a abstinência tabágica.